Vale tudo para ganhar uma Copa do Mundo. Pelo menos, da parte do brasileiro. E o começo já parte da invasãoda bondade de Deus, convocado a dar a sua ajudazinha, em qualquer situação, sem se levar em conta se ele é, ou não, brasileiro.
São os mais estranhos e engraçados os caminhos propostaos pelos nossos cartolas, técnicos, jogadores e torcedores para o placar nunca perder as cores verde e amarelo. Um dos campeões desses arranjos sobrenaturais é o treindor Mário Jorge Lobo Zagallo, um alagoano de Maceió, “naturalizado” carioca. Às vésperas da Copa do Mundo de 1998 o Lobo protagonizou mais um lance hilário do seu catálogo de supertições: deixou as secretárias da Confederação Brasileira de Futebol tontas para marcar um encontro dele com o empresário Roberto Marinho, o dono da TV Globo.
O que Zagallo queria? Preparar o terreno para ser comentarista de TV, caso perdesse a Copa do Mundo? Nisso ele não seria original, pois Romário já estava transado. Mas, enfim, o encontro fora marcado e o Lobo pôde respirar aliviado. Então, qual era a do Zagallo? Rei da supetição, escravo do número 13, ele achava que a Seleção só seria campeã se, na véspera da da viagem para a França, conversasse, trocasse “shakeshand“ e abraços com o doutor Roberto. Uaaauuuu! Que o doutor Roberto Marinho era um empresário competente, não se discutia. Ninguém sabia era que tivesse, também, poderes extraquotidiano que resultassem em taças e medalhas. Mas o Lobo descobriu aquilo, e tirava as provas: em 1994, antes de a seleção embarcar para os EUA, o então técnico Carlos Albeto Parreira encontrara-se com o homem. Resultado: pintou o tetra. Razão suficiente para, em 98, o Lobo e o Doutor ficarem olhos nos olhos. Quem sabe não pintaria um penta? Por isso, o ritual fora armado, no esquema, na boca do Lobo.
Mas coisas assim até que são infantis, se comparadas com registros anteriores. Exemplos: para ir à Liverpool, disputar a Copa de 1966, o então presidente da CBD, João Havelange, exigiu da Varig os mesmos piloto, có-piloto e tripulação que levara a Sseleção ao Chile, em 62. Mas, daquela vez, os contatos com a turma lá de cima não funcionaram, mesmo com Gérson entrando em campo fazendo o sinal da cruz e beijando a medalhinha; com Garrincha viajando com proteção especial de uma rezadeira que cuidava de um dos seus joelhos; com as correntes de orações invocando os santos mais poderosos e dos pés de pemba que o masagista Mário Américo encomendara na Bahia para espalhar nos vestiários.
Em 1970, quando, teoricamente, éramos mais civilizados, às vésperas da chegada da TV em cores ao país, a Seleção que foi ao México também não dispensou a superdição. E com comandava os contatos com o além? Ele, o Lobo, naturalmente. Como os canarinhos haviam vencido a então Tcheco-Eslováquia, na estréia, por 4 x 1, Zagallo usou, nos jogos seguintes, a mesma cueca. E bastou contar aquilo depois do segundo jogo aos demais membros da comissão técnica para todos aderirem à moda. Evidentemente que um time que tinha Carlos Alberto Torres, Clodoaldo, Gérson, Tostão, Pelé e Rivelino - só para citar poucos - não precisava da cueca de Zagallo para ganhar. Mesmo assim, Jairzinho também entrou na onda dos contatos iemdiatos com o além. Comprometeu-se a executar, à beira do gramado, o nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, se as forças ocultas lhe permitissem marcar um gol a cada jogo. Para não parecer cover de Petras, o tcheco que fez um gol no Brasil e depois ajoelhou-se, fazendo sinal da cruz, o Furacão precisou negociar um adiamento.
Jair Ventura Filho, o ponta-direita e cracaço do Botafogo, campeão carioca e da Taça Guanabara de 1967 e 68 comeu a bola diante dos techecos-eslovaos. Foi uma das maiores figuras em campo, marcando dois golaços, jóias do futebol mundial, um driblando vários marcadores e chutando a gol, sem chances de defesa para ao goleiro Viktor, que sofreu o outro gol dele levando um chapéu. Naquele dia, Jair, o Furacão, chamou as divindades num canto e voltou a dar a sua palavra de que após a sua terceira pipoca nas redes dos gringos cumpriria a sua parte no trato - e cumpriu.
Durante a Copa de 78, na Argentina, quem dava o espetáculo era o goleiro Leão. Se abaixava para tocar o chão ao adentrar o tapete verde do estádio de Mar del Plata e, depois, com as chuteiras, batia os calcanhares nas traves. De quebra, ainda dava um tapinha no travessão superior.
Toques no gramado, beijos na medalhinha, abraços em Doutor Roberto Marinho (como o fizeram os técnicos Carlos Alberto Parreira, antes da Copa de 1994, e Mário Jorge Lobo Zagallo, antes do Mundial-98), repeteco na indumentária, pó de pemba, etc isso nem chega perto da do que fazia um antigo cartola do Botafogo, Carlito Rocha. Contou-me Nílton Santos, maior lateral-esquerdo da história da Seleção Brasileira: "Era a década de 50 e Seu Carlito, antes de um jogo, viu um mascote tirar a pipizeira para fora do calção, olhar para o lado e alagar o pé do centroavante Paulinho Valentim, que marcou três gols naquele dia. No jogo seguinte, quando já estava no gramado, Paulinho foi obrigado por Carlito a voltar aos vestiários, descalçar a chuteira do pé pipizado e ficar lá quietinho, esperando. Sem entender nada, Paulinho Valentim só obedeceu. Em pouco tempo, Carlito voltou com o mascote, abaixou-lhe o calção e ordenou-lhe: "Faça pipi no pé do tio!"
A história terminou virando lenda, fazendo o percurso inverso das lendas que viram a verdade do contador da história. Também, convenhamos: esta deve ter sido a mais estranha, terrível, imponderável supertição de um cartola.
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